Click Literário

Ideias, histórias & umas mentiras sobre fotografia

Foto da mente

Então surgiu a fotografia e algum MALUCO deve ter pensado:

BOA, ENFIM PODEREI FOTOGRAFAR MEUS PENSAMENTOS!



PÉSSIMA IDEIA, claro, como em já demonstrou a distopia, infelizmente muito real e (cada vez mais) possível, Black Mirror em um dos seus episódios mais fortes, de acordo com VOZES DA MINHA CABEÇA ou mesmo MEU OLHAR, pra ficar no assunto

Caso você ainda não tenha assistido (toda série é muito boa mas muito pesada, eu mesmo não consegui terminar – embora escrevendo aqui de novo me bateu umas curiosidades pra ir até o fim hehe…), e caso você tenha estômago e coragem, vai lá no 3º episódio da 1ª temporada pra assistir “The Entire History of You” ou “Toda sua história”, cuja imagem de divulgação foi bastante relacionada com toda a série, talvez pelo fato dos olhos já chamarem tanto a atenção:

NETFLIX



Muita gente afirma que só conseguimos SOBREVIVER justamente pela nossa capacidade de esquecimento, o que me parece muito correto, pois eu mesmo tenho lá minhas coisas (traumas, medos, lembranças positivas ou nem tanto…) que SINCERAMENTE NEM QUERO LEMBRAR, fora as inúmeras que devo estar negando inconscientemente, EITA!


Mas voltemos à fotografia da MENTE, do pensamento, dessa caixinha mágica e ainda tão pouco compreendida que é O nosso CÉREBRO.

Eu ando lendo um livro de organização do tempo porque já achava meu cotidiano um pouco bagunçado e queria produzir mais e melhor, não sendo uma máquina em linha de produção, mas que fosse pra produzir mais… qualidade de vida, leia-se tempo pra mim, pras coisas paralelas da vida, esses negócios que todo mundo quer fazer mas não consegue porque “tá correndo”. Não sou exatamente bagunçado mas acho que sempre dá pra melhorar, e mesmo que sejam obviedades algumas merecem ser ouvidas ou lidas vez em quando.

Uma vez assisti a palestra desse cara, o Christian Barbosa, e curti muito algumas das suas falas e abordagens sobre tudo isso (já aí no site saca a frase boa: “pare de correr e comece a andar” – ah, boa, vai, admite…). Conversei um pouco com ele naquele evento, um guri super gente boa e com um olhar prático pra todas “ladainhas” que ficam dizendo o óbvio: organize-se, cuidado com a falta de foco, faça uma coisa de cada vez, e por aí vai… Claro que ele e suas obras têm seus papos coach no pacote, mas eu ainda acho válido e, como contava ali em cima, tô lendo seu livro mais conhecido, A tríade do tempo, se te interessa por estas cousas procura aí…


Eis que de repente, não mais que de repente, me deparo com referências à nossa querida e estimada SALVE-SALVE fotografia, ó:

Uma meta é como tirar uma fotografia do seu pensamento.” E segue logo depois:

“A visualização é a palavra-chave para você conseguir definir suas metas.”


[primeiro eu lembrei do maior fotógrafo de todos os tempos, Ansel Adams, que defendia a prática da visualização para alcançar suas fotografias, também assunto pra outro post que nesse já tô me enrolando…]


Claro que a citação do Christian tá num contexto empresarial, de organização do tempo, papos de produtividade e tals, mas achei curioso e acabei lembrando de algumas experiências feitas por alguns MALUCOS VANGUARDISTAS, desculpe a redundância, que pretendiam, SIM, FOTOGRAFAR A MENTE lá nos idos do século passado.

Como?


Ah, pois é… era ESSE o detalhe. De várias formas, na verdade…

No início do século passado a fotografia ainda buscava se instituir, ou mesmo estava se conhecer, em suas diferentes especialidades como publicidade, moda, fotojornalismo, fotografia científica, artística e por aí vai (vamos lembrar que não existe uma classificação “oficial” destes gêneros até hoje, nem sei se precisa mesmo…).

De forma geral, os vanguardistas tinham bastante interesse por novidades, pois estavam dispostos a criticar e questionar as noções e padrões de arte da época, preferencialmente rebelando-se contra aspectos excessivamente tradicionais como o romantismo e o naturalismo. E a fotografia ainda estava “meio perdida” na arte, embora já tivesse conquistado espaços importantes em Salões de Arte desde 1859 e mesmo que o cinema, de 1895, seja seu primo-irmão. Neste sentido, os vanguardistas seriam bastante simpáticos à inclusão de ciência e tecnologia em seus processos artísticos, pois também era uma forma de crítica.

Vêm desses questionamentos artísticos algumas das nossas lembranças daquelas obras MALUCAS vanguardistas, que despertam sinceras ignorâncias em muitas pessoas que afirmam “isso até meu sobrinho faz” sem considerar nem o contexto e, o que é muito pior, nem os objetivos daquelas obras.

Muito mais fácil, claro, criticar e falar mal SEM conhecer ou estudar. Este continua sendo um excelente caminho pra ignorância e o Brasil taí comprovando que tem muito público pra imbecilidades como estas – E MUITAS OUTRAS.

Mas voltemos à fotografia (ô foco!):



Além de obras visuais dadaístas que incluíam fotos, dos experimentos fotográficos futuristas apaixonados pela dinâmica e pelo movimento, além das fotos conceituais que os surrealistas produziram mesclando os mundos reais e irreais ou das diferentes inspirações fotográficas usadas pelos cubistas, nossa QUERIDA FOTOGRAFIA foi utilizada ainda como forma de estudo de processos criativos. AHÁ!

Aqui um exemplo no qual Robert Desnos (poeta francês que, dizem, falava e recitava dormindo) foi fotografado por Man Ray durante um dos experimentos que, a propósito, eram de vários tipos, como acordar abruptamente para anotar seus sonhos (acho que li em algum lugar que Einstein fazia isso, se não, fica por exagero deste autor, que já exercitou isso e se divertiu, confesso e te convido) ou registrar fotograficamente os movimentos do corpo e da face em busca de indícios de sonhos.

Esta foto ainda ilustra o livro NADJA, de André Breton, um romance surrealista no qual são inseridas diversas fotos doidas, doidas, como esta, publicado em 1928. É reconhecido como a grande obra literária do surrealismo quiçá – que é o jeito bonito de dizer SE PÁ – até do próprio Breton, a grande figura deste movimento.

Taí, Nadja merece um post só pra ele (se o livro) ou pra ela (se a personagem – paixão arrebatadora do narrador-autor, que sai em busca da sua amada pelas ruas de Paris, eita maluquice).

Todo mundo já teve algum sonho ou divertido ou importante ou com uma história legal talvez uma ideia genial e pensou “amanhã quando levantar eu anoto” e pela manhã… já ERAS, né não?

Pois estas experiências de alguns artistas tentavam esclarecer um pouco da outra parte do cérebro, mais abstrata, onírica, fantasiosa até. Eram tempos de DESCOBERTAS, bons tempos onde a ciência era um tanto mais respeitada, pra lembrar de uns fundo de poço por aí… Talvez com registros dos sonhos pudéssemos IR ALÉM na vida acordados. Muito além do charme do DESCONHECIDO, da riqueza do SUBEXPOSTO, da profundidade da nossa indecifrável MENTE poderiam sair respostas interessantíssimas. Uma VIAGEM, mas possível e bastante INTERESSANTE.

Em algum tempo do passado eu mesmo fiz alguns testes, quase brincadeiras-sérias, como estes. Além do caderninho ao lado da cama pra anotar qualquer coisa à noite (não era época de celular, haha), também me esforcei pra dormir sentado como o Desnos na foto do Many Ray, segurando na mão qualquer coisa mais pesada que, pela gravidade, iria ao chão quando eu eventualmente dormisse e abrisse a mão. Nunca consegui nada de extraordinário, confesso também, mas algumas histórias diferentes eu consegui sim! O exercício foi válido, enfim.

Nem nessa foto nem no relato do livro Nadja, o romance doido como toda obra surrealista tem a obrigação moral de ser, fica claro qual era exatamente o experimento ali, mas com essa turma de admiráveis malucos envolvidos TINHA que sair COISA BOA.

Eram maneiras de tentar esclarecer a mente como outras áreas faziam, vale lembrar que o próprio Freud havia lançado A interpretação dos sonhos poucos anos antes, em 1900. Na arte, porém, as técnicas podem parecer um pouco mais ousadas e menos acadêmicas: APROVEITE!


Bons clicks, boas leituras e bons experimentos!

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